terça-feira, 26 de junho de 2012

O Construtivismo Piagetiano como Reflexão Pedagógica na Escola Inclusiva.

Relato da experiência desenvolvida no Centro Educacional Escada do Tempo.
Uma História de AMOR.

O Centro Educacional Escada do Tempo foi fundado em Belém do Pará no ano de 1991, quando uma pedagoga paulista iniciou o sonho de ter uma escola que permitisse ver a criança como sujeito de uma construção chamada conhecimento. Esse olhar criador é o que move a criança a buscar compreender a sociedade e assim interagir com os estímulos a sua volta, fazendo com que ela consiga se expressar em sua singularidade e autonomia cognitiva.
No final de 1994 Marluce da Costa e eu, Mauri Gaspar, conseguimos comprar a escola, em função da dificuldade financeira vivida pela proprietária. Esta passou a se chamar Centro Educacional Escada do Tempo. Esse nome foi possível por entendermos que o conhecimento é fruto da ação do homem com a maturidade neuropsicológica de seu tempo presente, visto que o conhecimento se desenvolve por degraus de uma forma dinâmica, nunca permitindo a permanência da pessoa em um degrau, pois evoluir é um processo natural e torna-se compatível com o aumento da idade, elevando a mente sempre a novos desafios, onde aprender é uma necessidade e um fascínio em qualquer momento cronológico. Isso significa avançar na direção da eterna aprendizagem, colocando em transformação constantes as etapas do desenvolvimento cognitivo do ser humano desde sua vida pré-natal até o fim de sua vida, pois aprender é viver...

Em Belém a escola foi Dirigida pela Pedagoga Oldemira Abreu da Costa, tendo como professores Regina Costa, Marline Gaspar e Simone, além de um grupo de estagiários. Nesse período inicial de nossa atividade educacional trabalhávamos com pré-escolar e alfabetização.

No ano de 1996 a escola mudou-se para o município de Santarém, região oeste, no Estado do Pará, onde fixei residência, sendo que a escola passou a ministrar cursos e treinamentos na abordagem construtivista e assim conseguiu montar seu quadro de professores, buscando oferecer um ensino com um Projeto Político Pedagógico fundamentado na obra de Jean Piaget e Emília Ferreiro, esta formada em Psicologia, concluiu seu doutorado sob a orientação de Jean Piaget.

A riqueza teórica produzida por esse encontro genial entre Piaget e Emília nos possibilitou muitos anos de pesquisa e aprimoramento da proposta pedagógica no ato construtivo de fazer e analisar o resultado alcançado, possibilitando uma eterna construção e reconstrução do discurso e da prática no universo chamado aprendizagem humana.
           A escola começou integrativa, o termo inclusão ainda não estava inserido no dia a dia do meio acadêmico brasileiro, visto que o país havia acabado de assinar a Declaração de Salamanca, realizada na Espanha, sendo essa a principal Conferência Mundial de Educação Especial, onde 88 países e 25 organizações internacionais, em assembleia, reafirmaram o compromisso com a Educação para Todos, durante os dias 07 e 10 de junho de 1994.
Esta declaração reconhece a necessidade e urgência do providenciamento da educação para as crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais dentro do sistema regular de ensino e reendossa a Estrutura de Ação em Educação Especial...
Entre os princípios proclamados pela Declaração estão:
toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem;
toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de aprendizagem que são únicas;
sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam ser implementados no sentido de se levar em conta a vasta diversidade de tais características e necessidades;
aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola
regular, que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia centrada na criança,
capaz de satisfazer a tais necessidades;
escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais
eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos; além disso, tais escolas proveem uma educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram a eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional.
           A Escada do Tempo iniciou sua atividade educacional tendo como base filosófica os conceitos definidos pela Declaração de Salamanca, deslumbrando uma condição real de educação para todos, construindo um Projeto Político Pedagógico direcionado do Pré-escolar a Alfabetização, mais tarde a 1ª série do ensino fundamental, tendo como princípio o Construtivismo Piagetiano, à luz Integrativa e mais tarde Inclusiva.
            Assim, nosso pensamento e prática educacional se direcionaram a uma pedagogia que respeitasse o direito da criança portadora de deficiência mental, como denominada na época, bem como, tínhamos crianças portadoras de algumas deficiências físicas ou neurológicas, possibilitando que essas crianças pudessem estudar com crianças que não tinham essas características em seu aspecto físico e mental.
Quando assumi a gestão escolar e financeira da Escada do Tempo, mantive os ideais acima citados e isso foi possível graças a paixão eterna por minha mãe, conseguindo dessa forma homenagear e agradecer a ela tudo que fez por mim e meus irmãos no sentido de possibilitar a todos nós uma educação escolar exemplar. Minha bela mãe, Maria de Nazaré Nunes Lima, foi uma incansável professora primária, que se dedicou de maneira competente a educar crianças em inúmeras escolas, sem nunca ter perdido seu encantamento profissional pela nobre condição de ser professora. Conseguiu educar todos seus filhos naturais, com muita luta e renuncia pessoal, deixando sempre transparecer seu compromisso familiar e profissional, pois trabalhou muito, porém não deixou faltar ternura e convicção de que a educação muda o patamar da vida social da família. Nos momentos mais difíceis, ela foi à inspiração para superar os problemas, pois incansavelmente revelava sua preocupação com a pouca dedicação da escola às crianças portadoras de necessidades especiais, visto que quando se fala em escola inclusiva, essa ainda hoje é assediada por fortes preconceitos de que crianças com deficiência devem ficar longe de crianças sem deficiência.
Assim se estabelece um preconceito cultural que implica em uma fala de que crianças com nível inferior de inteligência atrapalham a aprendizagem de crianças com o nível mais elevado, dessa maneira a sociedade procura deixar claro que a causa da escola inclusiva é um problema e não uma solução. A desigualdade social é iniciada e legitimada pela escola, que deviria ser para todos em respeito ao art. 205 da Constituição Federal Brasileira. Quero lembrar que a Escola é uma instituição social criada pelo homem para repassar informações dos conhecimentos acumulativos de natureza do ato de pensar e do fazer do homem em sua sociedade.
Quando a escola ancora-se na concepção excludente, ela se torna uma pilastra mestra do capitalismo, pois qualifica apenas aqueles que podem reproduzir o capital, tornando-se força de trabalho. Mas por outro lado, quando a escola se permite pensar o homem em uma dimensão sistêmica, essa passa a se preocupar com a formação social das pessoas portadoras de deficiência mental, permitindo um avanço de socialização que objetiva o bem estar social do indivíduo e de sua família, pois trabalhar é um valor social importante, porém um ser humano ser amado por sua família e viver com dignidade, mesmo sendo diferente, é essencial para todos que conhecem essa realidade existencial.
A maioria das escolas brasileiras está preocupada apenas com a produção do capital, produzir riqueza material, o que não deixa de ser relevante, visto que o sistema econômico mundial é a soma da produção, com a hora de trabalho que resulta o capital, descontando a menos valia, que é o fator gerador do lucro.
Muitas escolas alegam não poder fazer parte da questão inclusiva e assim proporcionar uma educação para todos, fugindo do debate e da responsabilidade acadêmica de aceitar a diferença como condição da vida de ser diferente. Para essas escolas, a deficiência é uma exclusão natural; não sendo produzidas por elas, logo não faz parte de seu debate e de sua ação acadêmica.
O Centro Educacional Escada do Tempo lutou por 12 anos contra o absurdo e a ignorância que ainda perdura no dia de hoje, quando se fala de escola inclusiva. Apesar do tempo que o Brasil assinou a Declaração de Salamanca, este país ainda não demonstra ter vontade de praticar uma política pública educacional que ajude a construir um plano de ação pedagógica capaz de avançar no caminho da inclusão, diminuindo e muito a exclusão da criança portadora de necessidade especial, visto que qualquer ação intencionada ou realizada pelos órgãos governamentais nesse sentido, logo ganha um forte complemento de marketing político partidário, explorando com isso o assunto para retirar dividendos eleitorais, pois quando se visita essa escola, um ano após sua inauguração, proclamada em comercial nacional via televisão e rádio, observa-se do que foi dito na publicidade inaugural, pouco se encontra em plena atividade oferecida aos alunos que ali estão matriculados. Porém vale insistir no discurso de que é necessário fazer uma escola inclusiva brasileira, para o bem estar de todas as famílias que possuem filhos com dificuldades de aprendizagem, seja qual for sua condição física ou mental.
O Brasil fala do assunto, mas não oferece condições para que a questão seja pelo menos tratada com respeito, tendo maior valor científico, visto que a maioria dos professores que hoje recebem crianças com necessidades especiais em sua sala de aula revelam não ter conhecimento técnico de como poder atender a essa criança, chegando a ter receio de atender esse aluno. Esse fato faz da escola um lugar de exclusão institucional legitimada por força da falta de treinamento e de avanço teórico nessa questão, que é tão seria e necessária, visto que a criança portadora de deficiência não fez escolha, apenas está obrigada a conviver com a escolha feita sobre ela por parte do poder público, que produz assim uma questão de elitismo e consequentemente de segregação social.
Consciente de que o processo de aprendizagem está inserido na ação sócio educativa da criança com outras crianças, onde a diferença não é apenas ser diferente, mas sim uma singularidade de comportamentos revelados pelos aspectos motor e perceptivo que cada criança tem como explorar, passando a desenvolver de acordo suas habilidades, com sua condição própria. Este fator possibilita uma maior riqueza cognitiva social.
O Centro Educacional Escada do Tempo, visando praticar o construtivismo de uma forma ampla, desenvolveu inúmeros Projetos Pedagógicos que visavam uma maior proximidade entre alunos, pais, professores e comunidade, expandindo a ação educativa à realidade social da criança para além da sala de aula. Entre essas atividades estavam:
1ª - Amostra de Teatro, que objetivava levar a criança a interpretar seu personagem em condição de movimento, linguagem e representação social.
2ª - Projeto Escada Dance, que objetivava ensinar a criança o manuseio do dinheiro em uma sociedade de consumo.
3ª - Feira de Ciências, que objetivava levar a criança a experimentar alguns fenômenos físicos simples do seu dia a dia.
4ª – Projeto Sonhinho na Escola, que objetivava elevar o nível emocional e maturacional, visto que a criança chegava ao final da tarde ou início da noite, consciente de que iria dormir na escola sem a presença de pais ou responsáveis.
Esses projetos eram realizados uma vez por semestre, em meses diferentes, contemplado no calendário escolar.
5ª - Projeto Voz e Violão, que objetivava elevar o nível de comunicação verbal e corporal das crianças. Este era realizado uma vez a cada 15 dias, por um verdadeiro amigo da escola, meu estimado amigo, Balá, Poeta e Compositor Oriximinaense. 
 
 









 Além desses projetos, a escola realizava visitas a logradouros públicos e outras escolas com eventos culturais, mas também realizava suas festas como: Carnaval na Escola, Dia das Mães, Festa Junina, Dia dos Pais, Dia da Pátria e Festa de Natal.
Uma escola construtivista e inclusiva é possível, porém exige estudo constante e comprometimento da equipe de educadores como um todo, na linha da eterna pesquisa dos saberes Piagetiano e de Emília Ferreiro. Faz-se necessário estudar as estruturas mentais da Teoria Piagetiana, além de estudar e compreender a psicogênese do conhecimento e seus estágios (nível sensoriomotor de 0 a 2 anos, I nível pré-operatório de 2 a 4 anos, II nível pré-operatório de 5 a 6 anos-II substágio, I nível de estágio de operações concretas de 7 a 8 anos, II nível de operações concretas de 9 a 10 anos e operações formais de 10 a 12 anos), que passam por analisar o aspecto motor, verbal e mental da criança.
Uma prática construtivista implica em permitir a ação de construir, aceitando ver a criança como o centro e o agente do processo de aprendizagem, sendo esta, o sujeito ativo dessa busca, sua inteligência se expande e se desenvolve na construção de uma ação singular, representando sua compreensão cognitiva momentânea.
Para Jean Piaget, o desenvolvimento intelectual age do mesmo modo que o desenvolvimento biológico, visto que a inteligência não pode ser separada do organismo como um todo. Assim, os indivíduos se desenvolvem intelectualmente a partir de exercícios e estímulos oferecidos pelos meios que os cercam. Logo, a inteligência é resultado de exercícios e de uma constante busca de aperfeiçoamento das potencialidades do indivíduo.
Para Emília Ferreiro as crianças não aprendem do jeito que foram ensinadas. Sua teoria abriu uma nova forma de pensar a ação do professor-facilitador diante do aluno-sujeito, demonstrando que o ato de aprender está ligado diretamente à capacidade da inteligência da criança e não a do professor que pensa em ensinar.
O saber de uma criança se faz presente diante do professor, que ao valorizar sua iniciativa verbal, de escrita ou lúdica, se preocupa didaticamente em expandir tal fato, respeitando a condição cognitiva apresentada pela criança no ato da construção do conhecimento, e sendo sabedor de que o limite não existe para quem se propõe a aprender e nem para quem se propõe facilitar a aprendizagem, sendo esta a principal função do professor facilitador.
A inclusão escolar depende das respostas que a escola é capaz de organizar, as quais serão mais eficazes se houver formação que ajude o corpo docente a ponderá-las (ECCOS-pg. 481)”.
Construir é um ato de riqueza e individualidade humana, que se universaliza a partir do respeito à diferença de poder ser diferente.

"Precisamos Construir uma Escola Construtivista e Inclusiva de qualidade para desenvolver a Inteligência da criança brasileira!"

Prof. Mauri Gaspar.

Referência bibliográfica:
ECCOS – Revista Científica, São Paulo, v, 10. P. 480, jul./dez.2008.
FERREIRO. Emília – Alfabetização em Processo. Ed. Cortez, São Paulo.
PIAGET. Jean – Epistemologia Genética. Martins Fontes. São Paulo. 2002.